Luísa Luísa hoje não. Hoje queria estar longe não aqui,na Place Pigalle, na Plaza Mayor, na Patagónia nas nuvens, menos aqui, a ouvir-te repetir sem parar a mesma estória com que brincas e me chateias.
Queria tanto saber onde pôr as virgulas os pontos de exclamação, travessão-parágrafo quebra de linha e escrever palavras impressionistas, inventa-las como o O'Neill, mas esse já morreu, embora o P. duvide porque os poetas não morrem, mas morrem Luísa, para mal dos pecados dos que escrevem mal e não sabem de virgulas ou pontos.
Sim Luísa, estou a tentar não te ouvir, não estabelecer contacto visual, não te tocar, deixo-te órfã no teu mundo, talvez muitos tenham passado por ti sem te verem, caramba Luísa, sucede a todos e nem por isso morremos, o que te mata Luísa é de outro teor, o rancor que tens aos teus dias cinzentos. Não te olharam, nem eu agora quero ver-te, mas fala mulher, desabafa pra-í e faz o obséquio a ti própria de nos esquecer.
Como posso alhear-me de ti, fazer de conta que leio o raio do Ulisses até ao fim e roubo as vírgulas ao Joyce ou ler a Gavalda e copiar-lhe o estilo ou o Maupin e escondo-me de tão pequena que sou.
Vá lá Luísa, cala-te. Agora preciso concentrar-me nos números, um cm a mais e vais falar hebraico com o Criador, mas não, não te calas nem ficas quieta e lá ando eu de seringa na mão, até que te berro te espanto e te espeto. Desculpa Luísa, e sorrio-te enquanto vou pensando na gramática dos dias sem pontuação e te vou ganhando aos pontos ao ver o teu rosto serenar o corpo a ceder devagarinho.
Aconchego-te em silêncio, o meu e o teu finalmente e enquanto repousas na curva do meu braço, fico a olhar o resto de luz que vive no teu rosto e pergunto-me como puderam eles passar por ti sem te verem, sem te tocarem, esqueces-te, só isso Luísa, descansa agora companheira das tuas labutas imaginadas, enquanto eu, talvez agora, possa exactamente pôr ponto final.